Dados

O projeto de pesquisa desenvolvido entre fevereiro de 2013 e janeiro de 2015 desenvolveu um sistema de busca por informações e dados em órgãos oficiais, em organizações não governamentais e também com grupos, artistas e produtores culturais que em momento futuro poderão contribuir para políticas públicas para a cidade de Aparecida de Goiânia. Ao longo deste tempo, identificamos cerca de 400 grupos/artistas, cerca 60 entidades e 70 locais que dinamizam a cultura no município de Aparecida de Goiânia, um número expressivo diante da imensa dificuldade em chegar aos entrevistados e aos dados preliminares.
Diante deste universo, alguns artistas, grupos, produtores e entidades entraram em processo contínuo de aproximação com esta pesquisa, através de realização de entrevistas, aplicação de questionários e outros mecanismos de busca de informações. Há um conjunto de entendimentos que o grupo de trabalho já se sente seguro para discutir e averiguar as possíveis relações com o acontecer da sociedade global. A pesquisa buscou ainda nas impressões alcançadas ao longo deste período um foco de análise que possa articular aos movimentos que convivem com os aspectos culturais na tensão da vida metropolitana e que crava na cidade uma profundidade existencial, um sentido de resistência. 
A intenção, desta forma, extrapola a ideia de catalogar e identificar apenas. Pretendemos organizar as informações coletadas de maneira a fornecer um mapeamento das práticas culturais resistentes de Aparecida de Goiânia, para que os atores sociais interessados nestas manifestações possam se reunir e trocar experiências e potencialidades.
Os gráficos abaixo apresentam números referentes a pesquisa realizada com os 38 grupos, artistas e com as 12 entidades, em alguns casos as perguntas realizadas foram idênticas e sendo assim optamos por agregar os resultados em gráficos únicos, quando os resultados alcançados foram semelhantes. Em apenas um caso, quando os entrevistados foram questionados sobre a utilização dos espaços públicos optamos por separar a apresentação dos resultados, pois apresentavam uma diferença que foi considerada ampla. Na maioria dos casos, os dados se referem apenas aos grupos e artistas entrevistados. 
Em geral, a predominância em relação aos estilos artísticos foi da música, com 50% dos entrevistados afirmando que esta seria sua atividade cultural, como aponta o Gráfico 2, em Aparecida de Goiânia especificamente, lembrando que Goiás é um estado conhecido pela sua música sertaneja, facilitando mais ainda a difusão desta prática. Por mais que a dança, teatro e as artes visuais correspondam aos outros 50% das respostas, ainda predomina a música pela sua fácil difusão e por questões culturais características da região.





 


                       Nos resultados preliminares foi possível observar como boa parte dos grupos e entidades acredita representar uma manifestação tradicional, o Gráfico 3 demonstra que 71% dos entrevistados disseram que representam uma manifestação tradicional e 29% dos entrevistados afirmaram que não representam uma manifestação tradicional, isto sugere que características particulares da região resistiram as tentativas de massificação externas, e nestas manifestações grande parte se refere a música, isso se deve ao fato de ela estar vinculada a metrópole Goiânia, e ao estado de Goiás em si, considerado o estado no qual há grande predominância de musica sertaneja.
                       A maior parte dos grupos iniciou suas atividades entre 2000 e 2014, como pode ser observado no Gráfico 4, e dessa maneira, e ao relacionar esses dados com o fato que 71% dos grupos e artistas se consideram uma manifestação tradicional, é possível dizer que mesmo com o passar do tempo, as características culturais mais marcantes prevalecem, mesmo sendo cerca de 42% dos entrevistados, artistas que trabalham de forma individual, como demonstra o Gráfico 5.
Dentre os indivíduos entrevistados, 24% possuem faixa etária entre 19 e 25 anos, como demonstra o Gráfico 6, o que suscita a percepção que um dos motivos para que esses artistas não tenham ainda formação em sua área cultural, pois ainda são jovens, e, além disso, a maioria dos grupos não possuem laços familiares entre si, pois a maioria dos jovens possuem mais afinidades com núcleos em comum, e que não pertencem a sua própria família. Aspectos que foram observados também na pesquisa.




                    Os grupos em sua maioria se apresentam semanalmente ou esporadicamente, como pode ser observado no Gráfico 7, o que leva a entender que em sua maioria, são indivíduos que ainda não vivem do próprio trabalho relacionado à cultura e por isso precisam reservar apenas um dia ou dois dias da semana livres para se dedicarem a arte, pois ainda não têm condições de viver exclusivamente desta atividade, desta forma possuem outro trabalho distinto durante a semana.
Para difundir a prática, em maioria, cerca de 71%, utilizam a internet como veículo de divulgação do trabalho, seguido pelas formas orais e pessoais, que está expresso no Gráfico 8, como Boca a Boca, por ter sido uma expressão bastante utilizada pelos entrevistados, por serrem certamente as maneiras mais acessíveis, pois não exigem enorme investimento econômico (em alguns casos não exige investimento financeiro algum) e é tão eficaz ou até mais que outros métodos, pois nos tempos atuais, nada dissipa mais uma informação que a internet.



                    Relacionando resultados das perguntas anteriores, sobre a atuação do grupo, observa-se que a maior parte dos entrevistados respondem que a utilização dos espaços públicos em Aparecida de Goiânia é na maioria difícil ou muito difícil, com pequena variação entre as respostas dos grupos e artistas em relação as respostas das entidades, como pode demonstrado nos Gráficos 9 e 10. Diante desta perspectiva é lucido afirmar que há uma grande necessidade de lugares que não hajam burocracia paralisante e nem impedimentos para realizar esses ensaios.
Em relação ao poder público, temos uma característica recorrente em relação aos grupos, pois foram realizadas outras perguntas que tratam da ação do poder público e foi muito recorrente o surgimento da negação da ação do poder público. Os grupos não se sentem amparados de maneira alguma pelas políticas públicas de apoio a cultura, a maioria dos grupos pensa que o mesmo não viabiliza a discussão sobre cultura no município, havendo sobretudo uma crítica do fato de ser o poder publico escolhe o que de fato seja cultura no município. Os grupos/artistas também pensam que não e grande o planejamento da cultura no município.



                  Sobre os locais de atuação, nota-se uma relação direta com a dificuldade da utilização dos espaços públicos, cerca de 39% dos grupos/artistas responderam que os ensaios são realizados em local familiar, e igualmente, 39% afirmou realizar a preparação em local privado, pois são locais onde não há burocracia, nem intervenção do poder público envolvendo estes ensaios, foco de crítica dos entrevistados, pois a utilização dos espaços públicos é extremamente complexa e burocrática. E em relação aos locais de apresentação dos grupos/artistas, 50% dos entrevistados afirmou que se apresenta em locais privados, novamente levando ao ponto que os locais privados são menos burocráticos e impõem dificuldades menores no processo para a autorização da apresentação, ao contrário dos outros espaços públicos citados.



Em busca do entendimento das relações que as manifestações culturais estabelecem com a cidade, notou-se que o cotidiano em Aparecida de Goiânia cria permanências. A preparação, os ensaios e as apresentações dos grupos e artistas nascem em pontos que vão da intimidade da casa, passando por estabelecimentos privados destinados ou subdestinados a cultura. Em Aparecida de Goiânia a cultura produzida no acalanto dos lares e dos relacionamentos afetivos põe-se a enfrentar a realidade vivida na esfera coletiva dos bares e templos religiosos como locais de difusão e dinamização da cultura.  Aqui reside um dos pilares da tensão desta cidade em meio a metrópole, enquanto a tradição é garantida por vezes em trabalhos de benfeitores e guardiões da cultura, nota-se um distanciamento do poder público no processo de fortalecimento dos laços de produção da cultura. Os grupos ao escolherem estabelecimentos privados para difundirem suas práticas, o fazem exatamente por não perceberem que os espaços públicos consigam garantir a disponibilização permanente para as práticas culturais.
Como o espaço público é pouco destinado à cultura, e aqui nos referimos às praças e aos locais construídos com este fim específico, os grupos e artistas não conseguem manter a frequência em suas apresentações. Um número ínfimo dos grupos e artistas identificados em Aparecida de Goiânia consegue efetivamente custear suas vidas com os recursos vindos da prática cultural que desenvolvem. Os locais destinados à cultura são geralmente pensados para grandes eventos, o que contribui sobremaneira para a subjugação dos artistas locais a uma lógica de mercado distante, ou seja, artistas que já são de reconhecimento nacional possuem mais possibilidade de defender seu talento. Não há salas de música pequenas ou espaços para apresentações teatrais ou de dança para pequenas plateias, os grupos e artistas ficam circunscritos a uma dinâmica individual para garantia da permanência de suas práticas, é da esfera íntima que parte a resistência.
Se as particularidades carregam horizontalidades expressas na paisagem, em meio a corrida funcional a serviço da região metropolitana, há a lentidão da cultura que resiste. As feiras livres, comercializam os frutos da terra sem marcas, nestas situações o tempo é o tempo da chuva, do sol e das condições impostas pelos modos culturais característicos da produção alimentícia de Goiás. Na mesma direção, as danças e festas típicas guardam a necessidade da espera e da temperança, motes impensáveis para o mundo da velocidade contemporânea. A congada[1], a folia de reis[2] e a quadrilha[3] não são apenas representações da cultura local, elas marcam cotidianamente cada paisagem vivida pelos cidadãos. 
Uma quase ressalva, em Aparecida de Goiânia, como em toda a região metropolitana de Goiânia e por extensão em Goiás, é ainda possível perceber que outra parte significativa das manifestações culturais que são afirmadas pelos artistas como tradicionais, se refere à música sertaneja. A música que surge no campo, neste caso ganha novas conotações, o sertão em questão já não se manifesta de maneira tradicional como se poderia imaginar, por serem estas músicas um produto também de uma indústria fonográfica mundial. Fato que pode ser compreendido como a negação da possibilidade da resistência e também como uma tentativa de estabelecer com a terra de Goiás um marco autêntico e resistente.





[1] Manifestação cultural, com preponderância em festejos religiosos de origem afro-brasileira.
[2] Manifestação cultural cristã, baseada na figura dos três reis magos, caracteriza-se pelas suas músicas e cantos, além de visitas nas casas de moradores rurais e urbanos que recebem os foliões em festa.
[3] Manifestação cultural, com preponderância na dança de origem europeia, que assume no Brasil uma característica específica de comemoração dos festejos dedicados a santos católicos, que ocorrem no mês de junho.